COMO ATERRISEI UM BOEING 767 LOGO DEPOIS DO TERREMOTO NO JAPÃO EM 2011

Um piloto da Delta Airlines em seu primeiro voo sobre o Pacífico teve que declarar uma emergência para pousar seu 767 depois do terremoto de magnitude 9,0 que devastou o Japão quase duas semanas atrás. Aqui está seu tenso relato em primeira-mão.
 
O voo 91 da Delta, que saiu de Portland destinado ao aeroporto de Narita, em Tóquio, foi forçado a pousar no aeroporto New Chitose, a mais de mil quilômetros de distância. A publicação supostamente escrita pelo piloto e compartilhada em vários fóruns de aviação e no Reddit diz que a confusão entre os controladores de tráfego aéreo representou um perigo real nas horas seguintes ao sismo:
“Eu ainda estou inteiro, escrevendo do meu quarto no hotel da tripulação em Narita. São oito da manhã. Esta é minha primeira viagem sobre o Pacífico como novo comandante internacional de um 767 e tudo tem sido interessante, para dizer o mínimo, até agora. Cruzei o Atântico três vezes, por isso os procedimentos me eram familiares. A propósito, que panorama estonteante se tem ao sobrevoar as Ilhas Aleutas.

Tudo corria bem até estarmos a 160 km de Tóquio, descendo para a chegada. O primeiro indício de problemas foi quando o controle de tráfego aéreo do Japão começou a colocar todos em espera. No começo pensei que fosse um mero congestionamento na chegada. Então recebemos uma mensagem da companhia avisando sobre o terremoto, seguido por outra declaração de que o aeroporto de Narita estava temporariamente fechado para inspeção e que esperavam reabrir logo.
De nossa perspectiva as coisas estavam obviamente ficando um pouco diferentes.

O nível de ansiedade do controlador japonês estava bastante alto e ele disse que o tempo de espera era “indefinido”. Ninguém se comprometeria a um período de tempo, então notei que meu copiloto e o piloto reserva estavam bem ocupados, olhando os próximos desvios e nosso nível de combustível, que depois da travessia do oceano é tipicamente baixo.

Não demorou muito, talvez dez minutos, até que os primeiros começaram a solicitar desvios para outros aeroportos. Air Canada, American Airlines, United etc. Todos reportando situações de nível mínimo de combustível. Eu ainda tinha combustível para uma hora e meia a duas horas de espera. Desnecessário dizer que os desvios começaram a complicar a situação.

O controle de tráfego aéreo japonês então anunciou que Narita estava fechado indefinidamente devido aos danos. Os aviões imediatamente começaram a requisitar pousos em Haneada, próximo a Tóquio, meia-dúzia de aviões da Japan Airlines e outros aviões ocidentais tinham liberação para seguir naquela direção, mas então os controladores anunciaram que Haenada acabara de fechar. Agora, em vez de apenas aguardar, começamos todos a procurar alternativas mais distantes como Osaka ou Nagoya.

Um inconveniente dos aviões grandes é que você não pode simplesmente pousar em um pequeno aeroporto. Geralmente precisamos de muita pista. Com mais aviões chegando do ocidente e do oriente, todos procurando um lugar para pousar e muitos com níveis críticos de combustível, os controladores de voo começaram a ficar saturados.

Em meio à bagunça, e sem esperar que meu combustível chegasse a um nível crítico, consegui liberação para voar a Nagoya, a situação do combustível ainda estava ok. Tudo bem até aqui. Poucos minutos depois de tomar aquela direção, fui “ordenado” pelos controladores a reverter o curso. Nagoya estava saturada com o tráfego e impedida de receber mais aviões (leia “aeroporto lotado”). Idem para Osaka.

Com essa constatação, minha situação foi instantaneamente de “combustível ok” para “combustível mínimo”, considerando que precisaríamos desviar uma distância muito maior. Multiplique minha situação por um outro tanto de aviões, todos no mesmo barco, todos solicitando ao controle de voo uma liberação em outro lugar, todos ficando sem combustível com centenas de pessoas a bordo.

A Air Canada, e depois algum outro entraram em situação de emergência de combustível. Os aviões começaram e ser desviados para bases da aeronáutica japonesa. A mais próxima de Tóquio era a base de Yokoda. Entrei na competição. A resposta: Yokoda fechada! Sem espaço.

Agora havia um circo no cockpit, meu copiloto no rádio, eu pilotando e tomando decisões e o piloto reserva enfiado nas cartas aéreas tentando encontrar um lugar para ir dentro do nosso limite de autonomia, enquanto as mensagens da companhia chegavam atrás de nós.

Escolhi a base de Misawa, no extremo Norte da ilha de Honshu. Poderíamos chegar lá com o mínimo de combustível restante. Os controladores ficaram felizes por livrarem-se de nós, então saímos da confusão da região de Tóquio. Ouvimos os controladores tentando redirecionar os aviões para Sendai, um pequeno aeroporto regional na costa, que mais tarde acho que acabou alagado pelo tsunami.

Em seguida Atlanta nos mandou uma mensagem perguntando se poderíamos continuar até o aeroporto de Chitose, na Ilha de Hokkaido, ao norte de Honshu. Os outros aviões da Delta estavam indo para lá. Mais bagunça no cockpit – checar o tempo, cartas, combustível, ok. Seria possível ir até lá sem chegar a um nível crítico… se não tivéssemos mais atrasos de combustível. À medida em que nos aproximávamos de Misawa, fomos autorizados a seguir para Chitose.

Processo de pensamento de decisão crítica. Vamos ver – tentando ajudar a empresa – o avião passar por um aeroporto alternativo em perfeitas condições para ir a outro mais distante… imagino como isso ficará no relatório de segurança, se algo der errado.

De repende o controle aparece e nos dá um vetor para uma correção muito além de Chitose e nos pede para esperar as instruções. Pesadelo realizado. Situação rapidamente deteriorando-se. Depois de esperar perto de Tóquio, começar o desvio para Nagoya, voltar a Tóquio e depois re-desviar para o Norte em direção a Misawa, toda aquela feliz reserva de combustível que eu tinha estava sendo queimada rapidamente. Minha resposta foi algo como:

“Controle Sapparo – Delta XX requisitando liberação imediata para Chitose, combustível mínimo, impossível aguardar.”

“Negativo Ghost-Rider, o local está cheio”

“Controle Sapparo – Delta XX declarando emergência, combustível baixo, seguindo direto a Chitose”

“Roger Delta XX, entendido, liberado para Chitose”

Já era o suficiente. Eu estava decidido a me antecipar ao nível crítico de combustível enquanto estava em outra espera indefinida, especialmente depois de passar por Misawa, e usei minha última carta… declarando emergência. O problema é que agora eu tenho que enfrentar a burocracia da empresa, mas o que fazer?

E assim foi – pousei em Chitose, em segurança, com ao menos 30 minutos de combustível sobrando antes de atingir uma “verdadeira” situação de emergência. É sempre uma sensação boa, a de estar seguro. Eles nos taxiaram para algum lugar remoto, onde desligamos os motores e assistimos uma dezena de outros aviões entrando. No fim, a Delta tinha dois 747, meu 767 e outro 767 e um 777, todos em Chitose. Vimos um avião da American, outro da United e dois da Air Canada, também. Isso sem falar nos aviões da Al Nippon e Japan Air Lines.

P.S. – nove horas depois, finalmente apareceram com uma rampa para que pudéssemos descer e atravessar a alfândega. Mas isso é outra interessante história.
A propósito, enquanto escrevia isto, senti quatro tremores adicionais que tremeram levemente o hotel. Todos em 45 minutos.
Abraços
J.D.”
O Jalopnik US contactou a Delta para saber se a empresa pode confirmar quaisquer detalhes do relato.
Embora a empresa ainda não tenha respondido, conseguimos confirmar a história por outros canais.

fonte/Jalopnik
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