COM QUEDA DA ODEBRECHT, ELBIT, FABRICANTE ISRAELENSE DE DRONES, TENTA DECOLAR NO BRASIL
A
crise financeira gerada pelas descobertas da Operação Lava Jato sobre
os negócios do grupo Odebrecht acaba de provocar um efeito secundário
preocupante: o crescimento expressivo, dentro do Brasil, da principal
fabricante mundial de drones de uso bélico e alvo de fortes críticas de
organizações de direitos humanos.
No último dia 5, o Cade (Conselho
Administrativo de Defesa Econômica) aprovou a venda dos negócios de
comunicação militar da Mectron Engenharia, empresa da área de defesa do
grupo Odebrecht, para a Elbit Systems. Essa companhia é responsável pela
fabricação de quase todas as aeronaves não tripuladas usadas por Israel
em bombardeios na Faixa de Gaza, além de ter papel preponderante na
vigilância que envolve o muro erguido pelos israelenses para separar o
país do território palestino. Na última ofensiva de Israel, em 2014, a
organização Defense for Children International relatou que 164 crianças
foram mortas em ataques executados por drones fabricados pela Elbit.
A Elbit é a maior companhia privada da
área militar dentro de Israel. Somente com a produção de drones e a
venda deles para o Exército de Israel e forças armadas de outros países
em todo o mundo, a empresa faturou US$ 1,2 bilhão em 2015, conforme seu
último balanço.
Devido a esse envolvimento direto da
Elbit Systems nas ações militares de Israel, a corporação é alvo de
boicotes internacionais entre defensores dos direitos humanos e da causa
palestina, mas também por parte de governos estrangeiros, que acabaram
vetando negócios com a empresa. Entre eles, estão Suécia, Noruega,
Dinamarca (cujos fundos de pensão retiraram investimentos feitos na
empresa) e, mais recentemente, a França, que, em fevereiro deste ano,
anunciou que não compraria mais drones produzidos pela Elbit.
No Brasil, entretanto, a companhia
israelense opera normalmente. E com força. Desde 2008, quando a Elbit em
Israel passou a ser vinculada com violações de direitos humanos depois
que o Conselho de Direitos Humanos da ONU considerou que os ataques
apoiados por drones na ofensiva de 2008-2009 contra a Palestina
representaram graves violações de direitos humanos e possíveis “crimes
de guerra e crimes contra a humanidade“, a principal subsidiária da
empresa dentro do Brasil já recebeu mais de R$ 456 milhões das Forças
Armadas Brasileiras, especialmente da Aeronáutica, de acordo com dados
do Portal da Transparência do governo federal.
A empresa já tinha três subsidiárias
dentro do Brasil. A principal delas, que atua na área de drones, é a AEL
Sistemas Ltda, com sede em Porto Alegre.
O único sobressalto que os israelenses
tiveram em suas operações no Brasil aconteceu no final de 2014, quando o
então governador do Rio Grande do Sul, Tarso Genro (PT) cancelou um
acordo assinado no ano anterior com a AEL, que permitia financiamentos
públicos à empresa, além de acesso a tecnologias produzidas por
universidades gaúchas. O objetivo da parceria era a construção de um
parque aeroespacial militar no Estado.
É essa empresa que irá herdar os negócios
da Mectron na sensível área de comunicação militar – incluindo o
desenvolvimento de computadores de missão para drones.
No pacote negociado, também estão
sistemas de Rádio Definido por Software (RDS) e outros sistemas de
comunicação, além, claro, de todos os contratos vigentes da Mectron com
as Forças Armadas brasileiras. Nesse grupo está incluído, entre outros,
um contrato de R$ 193 milhões com a Força Aérea Brasileira, assinado em
2012 e ainda vigente, para a produção de um moderno e inovador sistema
de comunicação entre caças e torres de comando (projeto Link BR-2).
Os israelenses da Elbit agora terão
controle sobre isso – desde que as nossas Forças Armadas autorizem que
os contratos da Mectron sejam repassados para a Elbit. Consultada a
respeito pelo The Intercept Brasil, a FAB respondeu apenas que “O
assunto está sendo analisado pela Força Aérea Brasileira”.
Para Michel Temer, drones usados no Brasil têm “resultado extraordinário”
A chegada dos drones israelenses ao
Brasil começou em 2010. Em dezembro daquele ano, a Comissão Coordenadora
do Programa Aeronave de Combate, vinculada ao Comando da Aeronáutica,
acertou com a Aeroeletrônica (antigo nome da AEL, mas já controlada pela
Elbit), o fornecimento de dois drones Hermes 450, fabricados pela
empresa israelense.
Esses drones foram contratados sem
licitação. O argumento do governo era a notória especialização da
fabricante. De fato, o drone já tinha sido testado em combate havia
pouco tempo. Na ofensiva de 2008-2009 ao território palestino, Israel
usou e abusou desses mesmos drones para lançar bombas contra,
supostamente, alvos militares. Centenas de civis morreram.
Naquele mesmo ano, no Brasil, a Polícia
Federal também contratou drones, mas da EAE Soluções Aeroespaciais Ltda,
uma joint venture formada entre o grupo brasileiro Synergy, dos donos
da Avianca, e a empresa estatal israelense IAI (Israel Aerospace
Industries).
Em 2012, o então vice-presidente Michel
Temer elogiou entusiasmadamente a eficiência dos drones israelenses da
Elbit. Ao lado de um deles, em entrevista dada na ocasião, o então
vice-presidente destacou que o avião não tripulado produz “um resultado
extraordinário” e “uma eficiência extraordinária” no controle das
fronteiras.
Os contratos de 2010 abriram as portas do
Brasil para o mercado de drones. No ano seguinte, a Elbit anunciou uma
união com a Embraer para criar uma empresa destinada a produzir
aeronaves não tripuladas com design brasileiro, a Harpia Sistemas.
Diante da crise econômica no país, a empresa acabou sendo fechada em
janeiro deste ano. No entanto, em comunicado aos investidores, a Elbit
deixou claro que as empresas “concordaram em trabalhar juntas no
futuro”.
Os grandes eventos do país, mais
especificamente a Copa do Mundo de 2014, serviram de impulso para as
operações da Elbit no Brasil. Apenas em 2013, quando foi realizada a
Copa das Confederações, a empresa recebeu R$ 102,6 milhões do governo, e
os drones foram usados para monitorar inclusive as manifestações de rua
daquele ano. Foi o maior valor registrado até aqui.
Em março de 2014, a Elbit anunciou o
fornecimento de uma linha de Hermes 900 para a FAB. O Brasil foi o
oitavo país do mundo a adquirir essa aeronave, o drone mais moderno e
mais potente fabricado pela empresa israelense. O modelo tem autonomia
de voo de 36 horas e alcança raio de 300 km em relação à sua base em
solo. É o dobro da capacidade do Hermes 450.
fonte/foto/PortalTheInterceptBrasil/ViaNotimp
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