ANAC APONTA FALHAS EM FISCALIZAÇÃO DE CARGAS
A falta de regulação no transporte aéreo de cargas no Brasil impede a fiscalização da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) e põe em risco a vida de passageiros e funcionários das empresas de aviação. Estudo interno da agência reguladora alerta há cerca de um ano para a falta de um regulamento claro, mas até agora nada foi feito e o estudo continua na gaveta.
O documento, obtido com exclusividade pelo Estado, conclui que a fiscalização de cargas pela Anac está restrita ao peso dos objetos transportados e seu balanceamento na aeronave. O regulador também consegue ter controle sobre as cargas de valor e outros artigos perigosos no interior das companhias aéreas, mas boa parte dos volumes transportados não passa atualmente pelo crivo da agência. "Dessa forma, na atual estrutura da Anac, não há superintendência responsável por regular e fiscalizar o transporte aéreo de carga", relata a nota técnica.
Por isso, parcela significativa dos viajantes de avião no País está exposta a riscos oriundos de cargas ditas "especiais", como animais vivos, restos mortais, produtos perecíveis e artigos controlados - como armas, munições, explosivos e materiais radioativos - que não necessariamente foram fiscalizadas pelo órgão responsável pela segurança de voos no Brasil.
O problema é maior nos voos domésticos, já que no transporte de cargas ao exterior os regulamentos internacionais tendem a ser obedecidos. Além disso, ainda que a agência não possa fiscalizar de maneira eficaz o transporte internacional de cargas, outros órgãos do governo atuam nessa área, como Receita, Anvisa e Polícia Federal.
Mesmo assim, o documento aponta falhas identificadas por autoridades estrangeiras em contêineres embarcados no Brasil. "A Anac recebeu reportes da autoridade americana, com fotos das irregularidades encontradas no acondicionamento da carga", diz o relatório.
Para os voos domésticos, porém, não há regulamentação ou as normas existentes estão defasadas e não podem ser aplicadas. As companhias associadas à Associação Internacional de Transporte Aéreo (Iata, na sigla em inglês) precisam obedecer a normas para transportar animais vivos, mas no País nem sempre essas regras são cumpridas, já que não há quem as fiscalize.
Cão. O relatório cita o caso de um cachorro da raça pinscher que invadiu a pista do Aeroporto de Congonhas em dezembro de 2010 e atrasou seis voos. Para ilustrar os riscos potenciais da falta de regras, o documento cita um incidente no Congo em outubro do mesmo ano, quando um crocodilo escapou do compartimento de carga, causando pânico na tripulação, culminando com a queda da aeronave e a morte dos 20 passageiros.
E apesar de a Anvisa ter normas explícitas para o transporte de cadáveres em aeronaves civis, a Anac não possui regulamentação similar. "Atualmente existe grande demanda no transporte como bagagem de mão das cinzas de um corpo cremado. Os passageiros insistem em transportar junto a si os restos mortais do ente querido. Por outro lado, os outros passageiros se sentem desconfortáveis com essa ação", detalha o documento.
O relatório foi concluído no começo de maio do ano passado, mas foi arquivado pela diretoria da Anac, segundo informações obtidas pelo Estado. Procurados pela reportagem, nenhum membro da agência comentou a falta de regulação. Em nota, o órgão afirmou que se trata apenas de um estudo preliminar, "sem conteúdo decisório", mas poderá subsidiar a edição de futuros atos regulatórios.
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