COMO ANDA A SAÚDE DO TRÁFEGO AÉREO BRASILEIRO

Torre controle tiresImage via Wikipedia
O Jornal O Estado RJ foi investigar a “saúde” do tráfego aéreo brasileiro, devido à proximidade de eventos internacionais no país, como a Copa do Mundo e a Olimpíada. Com isso, foi entrevistado um controlador de voo com mais de 34 anos de experiência, que preferiu não ter sua identidade revelada, e contou como é o dia a dia desses profissionais que são responsáveis por zelar pela vida de milhões de pessoas que voam pelo país afora. O controlador revela pontos negativos e falhas no sistema aéreo nacional.

O Estado RJ: Há quanto tempo trabalha como Controlador de Tráfego Aéreo?

Fonte: Sou controlador de Tráfego Aéreo há 34 anos, tenho 56 anos e estou próximo de me aposentar, por direito, com 35 anos de profissão. Mas não sei como fazer isso, pois nosso salário é uma junção de gratificações e na hora de me aposentar, querem tirar todos esses benefícios e com isso, ganhar muito menos do que ganho hoje. Não dá para ficar recebendo só o salário, é muito pouco por tudo que fizemos e fazemos. Para eu continuar recebendo o que ganho hoje, dependo de uma ação ordinária da justiça, de uma liminar para eu poder manter o meu salário integral. Só não sei o que será de mim enquanto isso não sair. Se me aposentar agora, vou perder mais de mil reais em relação ao que ganho hoje.

O Estado RJ: Existe algum plano de carreira para os controladores?

Fonte: A nossa profissão não é regulamentada, e isso só ocorre pelo fato de termos civis e militares trabalhando na mesma função. Se não há regulamentação, não pode haver um plano de carreira. O salário dos civis não pode ser maior do que o dos militares e nem o dos militares pode aumentar, pois tem que seguir a hierarquia do regime militar. Por lei, eu poderia me aposentar com 25 anos de trabalho, pois minha profissão é insalubre, mas o funcionário público nunca teve a aposentadoria especial votada pelo Congresso, desde que foi feito o Regime Jurídico Único. Mesmo recebendo insalubridade, não temos esse direito.

O Estado RJ: Muitos voos chegam e saem do país a cada hora. É seguro voar de avião?

Fonte: Eu não me sentiria seguro não. Os controladores não estão preparados para o volume de aviões que circulam hoje no país. A preparação é muito superficial, e poucos têm experiência. Além do mais, órgãos competentes estão repletos de pessoas com pouco conhecimento do setor, mesmo elas assumindo cargos de chefia. Não bastasse isso, existe uma desistência muito grande nessa área devido à grande responsabilidade, ao excesso de pressão e ao salário não muito atrativo. Então, muitos ficam ali até conseguirem passar em outros concursos. 

Já os concursos de admissão existem todo ano, mas a evasão de pessoal é muito maior do que a demanda. A profissão não é regulamentada, por este motivo vivenciamos esse entra e sai, prejudicando demais a qualidade do serviço prestado. O problema é que se esse serviço não for prestado da forma correta, coloca em risco a vida de muitas pessoas.

O Estado RJ: Qual sua opinião sobre militarização do controle do espaço aéreo?

Fonte: Para mim, tráfego aéreo e regime militar não combinam. Só em alguns países subdesenvolvidos que o controle está na mão dos militares. O Brasil é um país que cresce, a economia cresce, o tráfego aéreo cresce também, mas só em número de aviões, pois a estrutura ficou estagnada e isso só tende a piorar.

O Estado RJ: Casos de quase colisão são muito frequentes?

Fonte: Muito, muito, muito... mas isso se dá, como já falei, pela falta de preparo e interesse dos profissionais que estão ali geralmente cansados, pois vieram direto de um curso, da faculdade ou de outro trabalho até. Na minha época, muitos colegas também exerciam outras funções, como médicos, dentistas, professores, além  de controladores de voo, mas tinham o controle de voo como um prazer. Até uns anos atrás eu amava minha profissão, hoje faço por obrigação.

O Estado RJ: É uma responsabilidade enorme tomar conta de vários voos simultaneamente. Existe um preparo psicológico para os profissionais?

Fonte: A verdade é que quem se interessa mais pela profissão se vira do jeito que consegue. Isso vai muito de cada um também, a parte emocional conta bastante. Ali dentro, vivemos em um estresse constante e o problema é conseguir sair de um dia de trabalho sem levar aquilo pra casa ou até mesmo trazer os problemas pessoais para o trabalho. Até temos um auxílio psicológico, mas somente posterior a um fato e não um trabalho de educação, algo preventivo para tentar evitar um transtorno ou um distúrbio emocional no controlador. Temos que ter muito sangue frio e atenção redobrada.

O Estado RJ: O que foi na verdade o “Apagão Aéreo"?

Fonte: A verdade é que os controladores ficaram arrasados com a “covardia” do governo em apontar os controladores que estavam trabalhando em São José dos Campos (local onde o Legacy decolou rumo aos Estados Unidos), como culpados pelo acidente entre o 737 da Gol e o Legacy em setembro de 2006 na Amazônia. Mas para o governo, é muito mais fácil apontar um culpado do que assumir que esses mesmos controladores não estavam preparados para estarem onde estavam, pois foram reprovados diversas vezes pelos instrutores, mas como não havia pessoal suficiente para suprir a demanda, tiveram que assumir  o controle mesmo assim.

Com isso, nós resolvemos adotar uma operação padrão, onde aumentamos a distância de um avião para o outro reduzindo a possibilidade de um eventual acidente, mas o governo, ao invés de nos apoiar, mandou prender todos os controladores militares que resolveram adotar esse procedimento.

O Estado RJ: Depois desse “apagão”, o Brasil está preparado para receber eventos de grande porte como Copa e Olimpíada?

Fonte: De forma alguma, hoje, cinco anos depois de tudo que se passou, o número de controladores é o mesmo daquela época. Mas em compensação a aviação cresceu uns 60%, por isso eu digo que estamos à beira do caos. Tráfego aéreo não é só saguão de aeroporto. Podemos perceber isso no próprio Galeão (Aeroporto Internacional Antônio Carlos Jobim), onde se demora bastante tempo para encontrar uma vaga no estacionamento. Diariamente, filas se formam na entrada do aeroporto.

fonte/OestadoRJ
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