UPS EM ALTA VELOCIDADE


No coração do worldport: mais de 300 mil pacotes percorrem os 240 quilômetros de esteiras a cada hora. Ninguém toca neles, é tudo automático

Todas as noites, infalivelmente às 23h, os céus se abrem sobre a cidade de Louisville, no Estado americano de Kentucky. O movimento é preciso, no exato ponto de encontro entre a latitude 38°09' Norte e a longitude 85°44' Oeste. Começa, então, uma diferente revoada. Pássaros metálicos gigantes, de corpo branco e cauda marrom, decolam e pousam às centenas até o amanhecer seguinte, num ritmo cadenciado: um a cada 90 segundos. Chegando ou partindo, estão sempre carregados. Em terra, descansam alinhados enquanto alimentam um imenso ninho, com o tamanho equivalente a 40 campos de futebol, e dão vida a uma frenética atividade em plena madrugada. Naquele pedaço de 371 mil metros quadrados encravado dentro dos limites do aeroporto internacional de Louisville não se dorme nunca. Dali, a UPS, uma das maiores empresas de logística do mundo, se conecta com sua frota de mais de 260 aviões a mais de 200 países em todos os continentes. Naquele período, o espaço aéreo pertence apenas às aeronaves de carga da empresa (que, em número, a tornam a nona maior companhia aérea do planeta). E, a partir dos milhares de contêineres que elas despejam todas as noites, tem início uma operação quase invisível, mas de proporções impressionantes. A cada hora, 304 mil pacotes e caixas de todos os tamanhos passam por ali, numa conexão entre o seu ponto de partida e o seu destino final. São tocados apenas duas vezes, ao serem desembarcados na chegada e reembarcados na saída, embora seis mil pessoas estejam trabalhando simultaneamente em meio a uma incrível teia de esteiras rolantes de alta velocidade. Em termos de volume e automação, não há nada que se compare ao que acontece no Worldport, o maior centro de operações da UPS, uma potência de 102 anos de existência e US$ 51 bilhões de faturamento global.

Erguido a partir de 1982, com sucessivas expansões, a um custo de US$ 1 bilhão, o Worldport colocou uma tranquila cidade interiorana no mapa da economia mundial. Por que Louisville? A geografia e a meteorologia têm a resposta. O clima da região, mais estável que em outros pontos do país, é perfeito para quem depende de pistas de pouso permanentemente abertas. Estrategicamente localizada no centro da metade mais densamente povoada dos Estados Unidos, dali se pode alcançar, de caminhão, 80% da população americana em menos de 48 horas. Embora a companhia seja hoje global, a demanda doméstica ainda é crucial para seus negócios. "A UPS transporta 6% do PIB americano", resume Stephen Flowers, presidente da companhia para as Américas. Numa conta rápida, cerca de US$ 850 bilhões em encomendas vão e vêm por ano nos aviões e nos caminhões marrons da empresa - e o entroncamento de Louisville tem tudo a ver com esse movimento todo. O Worldport, assim, vira também um indicador da atividade econômica do país. O clima recessivo diminuiu, de fato, a revoada noturna e o trânsito incrivelmente organizado de pacotes pelos 240 quilômetros de esteiras automatizadas do centro de operações. "É nessas horas que faz diferença ser uma empresa internacional", afirma Flowers à DINHEIRO . "O movimento cai aqui, mas aumenta em outras regiões, como entre Brasil e Europa ou China."

Mais que o orgulho de uma empresa centenária, o Worldport é o principal cartão de visita da UPS na captação de clientes para suas outras áreas de atuação. A eficiente complexidade daquela cidade de vias superpostas atesta a capacidade da empresa, que nasceu com dois telefones e uma bicicleta na cidade de Seattle, em assumir tarefas grandiosas e com alta exigência tecnológica. A UPS investe US$ 1 bilhão ao ano em pesquisa e desenvolvimento - e parar, por alguns minutos, a observar um simples envelope com documentos viajar pelo Worldport permite entender como esse dinheiro é gasto. No trajeto entre a entrada e a saída do centro, cada encomenda permanece em média apenas de 12 a 15 minutos trafegando a uma velocidade de 55 quilômetros por hora. Num sobe e desce aparentemente desordenado, passa por seis leitores ópticos, que, automaticamente, definem o trajeto a ser percorrido até o contêiner que o levará ao seu destino final. Hoje, em 24 segundos, duas mil encomendas são processadas no Worldport. Quando tudo começou, em 1982, levava-se uma noite inteira para fazer o mesmo trabalho.

Dentro e no entorno do aeroporto, o tráfego de veículos com a cor e o logo da companhia é incessante. A frota total da empresa, em todo o mundo, está prestes a chegar aos 100 mil veículos. No Brasil, são apenas 80, retrato da dimensão dos negócios da companhia no País. A operação brasileira é recente. Antes focada quase exclusivamente em remessas internacionais, somente há quatro meses a empresa iniciou um serviço doméstico de entrega de pacotes e documentos - e ainda restrito a 98 cidades de São Paulo, Rio Grande do Sul e Rio de Janeiro. Sob o comando da executiva Nadir Moreno, a filial enxerga mais perspectivas na sua divisão de serviços de Supply Chain, através da qual assume, como terceirizada, operações que vão do controle de estoque à assistência técnica de equipamentos eletrônicos fabricados por seus clientes. Dentro de uma das sedes da empresa em São Paulo, por exemplo, trabalham há um ano 50 pessoas voltadas apenas para reparar aparelhos celulares da marca Sony Ericsson. A fabricante contratou a UPS para fazer toda a operação de pós-venda de seus celulares, incluindo atendimento ao cliente, recolhimento, conserto e devolução do aparelho ao usuário. "O Brasil é crucial para nossa área de logística. Nosso desafio hoje é convencer o governo a investir mais em infraestrutura e na redução da burocracia alfandegária", afirma Jose Garcia, gerente de operações para a América Latina.

Áreas exclusivas destinadas aos clientes são encontradas cada vez com mais frequência nos grandes armazéns da UPS mundo afora. Em Louisville, próximo ao Worldport, a Toshiba tem um centro de reparos de notebooks erguido dentro do mesmo complexo em que a Embraer mantém um estoque de peças para reposição no mercado americano. No grande corredor da companhia brasileira, uma grande faixa diz: "Não é um pacote, é um passageiro." Próximo dali, enormes galpões com temperatura controlada concentram estoques e até áreas para manipulação de medicamentos, destinadas para empresas do setor farmacêutico. A divisão de Saúde é a mais recente aposta da UPS em propiciar serviços cada vez mais especializados e com valor agregado. Novas unidades destinadas ao segmento foram abertas em Porto Rico e em Singapura. Em 2010, a divisão deve voltar sua expansão para a América do Sul - e o Brasil pode receber novo investimento. O lema da área é: "Não é um pacote, é um paciente." Passageiro ou paciente, é provável que ele participe da revoada diária de Louisville.

fonte IstoÉ Dinheiro

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