MINHA HISTÓRIA: EX-MECÂNICO DA VARIG CRIA FABRICANTE DE AVIÕES EXPERIMENTAIS



Apaixonado por aviação, o gaúcho Jocelito Wildner, 48, já serviu à Força Aérea Brasileira, foi mecânico da Varig, piloto de ultraleve e construiu planadores. 

Há cinco anos, com a ajuda financeira de amigos, deu início à Wega, fabricante de aviões experimentais (voltados ao lazer). Com oito modelos produzidos, a fábrica participou de uma feira internacional em abril e atrai o interesse de investidores.

Minha paixão por aviação vem desde criança. Cresci em uma fazenda em Ijuí (RS), neto de colonos alemães e italianos. Meu pai era projetista de máquinas agrícolas para indústrias da região.

Tivemos uma infância humilde. Sem dinheiro para comprar brinquedos caros, eu e meu irmão, Ênio, fabricávamos nossas próprias bicicletas, de madeira. Acho que parte desse interesse vem do sangue --dizem que os alemães são mecânicos natos.

Também construímos uma espécie de asa-delta de madeira para pular de cima de galpões. Na primeira tentativa, nos esborrachamos no chão. Tomamos a maior bronca de meu pai e desistimos.

Aos 18 anos, fui para Santa Maria (RS) prestar o serviço militar na Força Aérea Brasileira. Quando terminei, me mudei para Porto Alegre para fazer um curso de robótica. Já sabia que queria trabalhar com aviões.

Acabei passando em um concurso para entrar para a escola de mecânica da Varig em Porto Alegre, em 1986. Na época, a empresa era conhecida pela qualidade de seu serviço de manutenção.

Fiquei dois anos trabalhando como mecânico lá, até que amigos me chamaram para ajudar em uma indústria de equipamentos médicos que estavam montando.

Sabiam que gostava de projetar e me pediram para desenhar algumas máquinas de hemodiálise. Mas vivíamos o período da hiperinflação e o negócio não foi para a frente.

MUDANÇA
Foi quando resolvi ir morar em uma ilha. Me mudei para Florianópolis em 1993 e comecei a voar de ultraleve, após concluir um curso de piloto. Durante sete anos, vivi disso, levando turistas para voos panorâmicos sobre as praias da cidade.

Em um desses passeios, em 2000, conheci um francês louco por aviação como eu.
Ele queria construir um planador. Tinha um projeto e o dinheiro, mas precisava de alguém para construir. Topei a empreitada. Arrumamos um galpão, desenhei as formas das peças, treinei gente para trabalhar comigo.

Em cinco anos, conseguimos produzir 12 unidades e vender para o exterior.
Mas era muito difícil. Gastávamos US$ 70 mil para fazer e era uma briga para conseguir vender a US$ 30 mil.

Em 2005, fui à França fazer um serviço de manutenção de um desses planadores, que durou 45 dias.

Aluguei um motor-home em um camping e, à noite, comecei a desenhar meu avião. Decidi que era a hora de colocar esse sonho de pé.
De volta ao Brasil, me debrucei sobre os livros de construção aeronáutica. Tive sempre uma frase na cabeça, do projetista Joseph Kovacs, criador do Tucano, da Embraer: "Juntando as melhores partes de cada avião você vai construir um bom avião".

Por isso, busquei os melhores fornecedores para cada peça do aeronave. As hélices vêm da Alemanha, onde se fabricam as melhores hélices. Os motores, dos Estados Unidos, e assim por diante.

Contei com a ajuda de amigos e do meu irmão. Eles compraram os três primeiros aviões e pagaram antecipadamente, para que eu usasse o dinheiro na produção. Investimos R$ 1,5 milhão.

MÃO NA MASSA
Desde o início da empresa, em 2006, trabalhei todos os dias nesse projeto. Entrava às 8h e saía às 23h, 24h.

Hoje já reduzi o ritmo de trabalho, saio às 22h. Aos sábados, para descansar, vou para o aeroclube pilotar.

Coloco mesmo a mão na massa. A estrutura do avião sou eu que faço, a partir de insumos importados. Opero a máquina de solda e construo a parte elétrica. Apesar de a mão de obra ser treinada, estou de olho em tudo.

Levou um ano para o primeiro avião ficar pronto, em 2010. Hoje, já entregamos três e temos cinco em produção.

Há investidores interessados na empresa, batizada de Wega. Quero fabricar aeronaves SLA [leve esportiva], que podem ser usadas para algumas atividades comerciais.

Nos últimos anos, a Fiesc [federação das indústrias de Santa Catarina] se interessou pelo projeto. Com a ajuda deles, conseguimos voar com nossos aviões para uma feira do setor, na Flórida, em abril.

Foram mais de 50 mil quilômetros, entre ida e volta, com oito paradas por trecho. A aeronave voa a 350 km/h, uma velocidade acima da média para a categoria.

Foi um voo tranquilo. Vimos paisagens lindas, como o mar do Caribe e a floresta Amazônica. Senti que realizava um sonho.

Os negócios na feira também foram ótimos. Saímos de lá com duas encomendas engatilhadas. Agora, quero continuar melhorando o nosso produto para competir com os melhores do mundo.

fonte/FolhaSP/ foto/Divulgação

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